Após estrear em Havana e rodar pela Europa, o filme volta a ser exibido em Brasília com entrada franca
O maravilhoso documentário “Cuba Jazz”, dos diretores brasileiros Max Alvim e Mauro Di Deus, terá uma exibição especial em Brasília na próxima quinta-feira (8), às 20h, no Teatro dos Bancários. A sessão única terá entrada franca. O espaço fica na entrequadra 314/315 Sul e possui 474 lugares. Chegue cedo para garantir o seu espaço. Mais informações: 61 3262-9000
Sobre o filme, escrevi para a Socialista Morena no ano passado o artigo que reproduzo abaixo, junto com o trailer.
Cuba Jazz: uma viagem musical que retrata a renovação da ilha comunista
O documentário dirigido pelos brasileiros Max Alvim e Mauro di Deus não é um filme sobre jazz, mas uma peça conduzida por esse gênero livre e libertário por essência
Tal como uma jam session –“descarga”, na gíria cubana– no jazz, os caminhos que uma revolução percorre são imprevisíveis no decurso do tempo. Na música, o resultado quase sempre é saboroso aos ouvidos. Na vida de um país marcado a ferro e fogo – perdão pelo clichê, mas no jazz eles também existem – pelo sistema político-econômico dominante, as inevitáveis contradições desagradam e geram ferozes críticos e perseguidores. Além de vítimas, obviamente.
Em Cuba Jazz, documentário dirigido por Max Alvim e Mauro di Deus que está começando a viajar pelo circuito de festivais no Brasil e no mundo (ainda inédito no circuito comercial brasileiro), a charla política atravessa boa parte do filme e traz múltiplas visões –por vezes díspares, mas também convergentes, ainda que expressadas de formas distintas– sobre a música, a cultura e os processos sociais engendrados na ilha rebelde a partir do evento de 1959.
A certa altura, o sopão do qual fala a prodigiosa cantora e compositora Daymé Arocena é uma metáfora precisa para descrever a rica fusão de ritmos da qual resulta o autêntico jazz cubano, que demarca espaço em relação ao latin jazz devidamente abrigado no mainstream com suas classificações cômodas e reducionistas. Dizer isso é descrever o óbvio para quem assistiu à obra, mas pode instigar o olhar de quem não a viu e tampouco visitou ou estudou minimamente o “fenômeno” Cuba para além das visões cristalizadas a partir de um ou de outro campo ideológico.
Meio que instintivamente, esta mescla intensa –prolificamente abordada na película de som perfeito e fotografia que é poesia pura– nos remete à diversidade que tão bem experimentamos entre o Oiapoque e o Chuí. Não por acaso, essa característica é o que está por trás da “potência musical” mencionada numa das conversas para se referir aos Estados Unidos, a Cuba e ao Brasil.
Outrora com as fronteiras fechadas ao intercâmbio com outros países não alinhados à luta anticapitalista ou contrários ao bloqueio imposto pelos EUA, Cuba vive hoje um momento de profunda renovação interna e “descobrimento” de linguagens e possibilidades musicais em outras paragens. Ao contrário da Revolução, que teve e ainda tem muita dificuldade para se reajustar, a reinvenção musical em Cuba é algo permanente que, nas últimas duas décadas ganhou novo impulso a partir de uma juventude engenhosa e ousada, talvez até demais para alguns puristas.
Com ênfase, Cuba Jazz– que não é um filme sobre jazz, mas uma peça conduzida por esse gênero livre e libertário por essência– retrata essa renovação na forma e no conteúdo. A maioria das entrevistas apresenta jovens que são virtuoses em suas respectivas searas, alguns já com renome internacional.
Um destes talentos excepcionais é o trompetista Yasek Manzano, 36, citado como “o Miles Davis do século XXI” por ninguém menos do que Wynton Marsalis, também expoente do trompete, parte dos “Young Lions” de New Orleans e vencedor de nove Grammys, conquistados nas categorias jazz e música clássica.
Boca larga e lábios desconjuntados pelo hábito do ofício, Manzano, mais do que entrevistado, é personagem central e um dos condutores da peça de 85 minutos que nasceu a partir de mais de 100 horas de gravação e ainda pode ganhar irmãos no futuro breve. O papel de Manzano, entretanto, é dividido sobretudo com o guitarrista Jorge Luis Chicoy e a carismática Daymé Arocena.
Ao fim das contas, Cuba Jazz encanta corações pela beleza artística, arrebata mentes pelo roteiro a um só tempo denso e delicado, fascina pelo primor que é a seleção musical e cativa pelo deleite que é ver de forma tão próxima e sem maquiagem a essência afável e faceira da sociedade cubana. Ademais, não serão poucos os novos amantes do jazz surgidos a partir dessa obra.
Rogério Tomaz Jr. é jornalista brasileiro, morou em Montevidéu e visitou Cuba em 12 dias, 1700 quilômetros e 150 mojitos na virada de 2010 para 2011.